Esperança em Tempos de Apostasia – Parte 1

Esta nova série de artigos do Jardim Clonal tratará da Esperança da Igreja em Tempos de Apostasia. Serão apresentados, em várias edições, estudos em escatologia (comparando o que os textos da Epístola de São Paulo aos Romanos capítulo 11, do Livro do Profeta Daniel Capítulos 9, 11 e 12, do Evangelho de São Mateus capítulo 24, das Epístolas de São Paulo aos Tessalonicenses, da Epístola aos Hebreus e do Livro de Jeremias podem nos ensinar sobre a decadência da Falsa Igreja, a Apóstata que se deita com a Mãe de Todas as Abominações - bem como sobre a vitória e progresso da Verdadeira Igreja, a Pura Noiva de nosso Senhor Jesus Cristo). Oremos para que o Senhor nos abençoe nestes estudos, para que Sua Palavra seja apresentada aqui pura e límpida, sendo refrigério para nossas almas em tempos trabalhosos e fonte perene de esperança e forças levando-nos a conhecermos, pela Graça de Cristo, o poder das palavras do Apóstolo Paulo quando diz: já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim; e esse viver que, agora, tenho na carne, vivo pela fé no Filho de Deus, que me amou e a si mesmo se entregou por mim [Gálatas 2:20].

A Fé e a Piedade dos Puritanos

Algumas vezes, nos círculos teológicos da Internet, a Igreja Congregacional Kalleyana tem sido chamada de Igreja Congregacional Puritana. A razão disto é que Robert Reid Kalley tinha todas as características de um Puritano do século XIX, características as quais temos lutado para resgatar em nosso meio desde que iniciamos o processo de Reforma em nossas congregações. Processo este que, pela Graça de nosso Senhor, deu à luz a nossa denominação. A este respeito, o tema número 32 de um de nossos Símbolos de Fé (chamado Reflexões Bíblicas) diz que “o Puritanismo pode ser considerado um dos mais sublimes e santos modelos de vida cristã de todos os tempos”. Esta afirmativa não é, em nada, exagerada. Portanto, ainda nos falta muito para sermos realmente uma Igreja Puritana. Contudo, peço ao Senhor que não nos permita esmorecer, mas que nos dê, pela Fé em Cristo, uma porção do Seu Espírito como a que foi derramada sobre aqueles Santos homens do passado.

A teologia e a piedade Puritanas encontram poucos pares em toda história da Igreja. Como um movimento, o Puritanismo teve mais influência sobre a história do Protestantismo do que qualquer outro grupo isolado. A sua teologia moldou-lhes uma atitude ante o mundo que é a perfeita expressão da doutrina calvinista da Soberania de Deus. Eles realmente viviam como quem crê em um Deus que é Todo-Poderoso e ordena todas as coisas para o bem daqueles que amam ao Senhor, daqueles que são chamados segundo o seu propósito [cf. Romanos 8:28]. Um de seus lemas - vincit qui patitur (o que persevera no sofrimento, conquista) – demonstra quão firme era a expressão de sua Fé. Uma firme crença no cuidado e nas promessas de Deus, a qual é visível:

  • Na dedicação com que escreviam seus longos livros - plenos de conhecimento teológico e de devoção pessoal;
  • Na forma como pregavam – escravos do texto Bíblico, porém entregues com todo o seu ser ao sermão que proferiam;
  • Nas suas batalhas no Parlamento - para que a Lei do Estado fosse a mais próxima expressão da Lei de Deus;
  • E nas suas lutas nos campos de batalha - para que os monarcas tiranos e corruptos não dominassem sobre o povo e sobre a Igreja.

É verdade que muitas dessas vitórias foram transitórias, contudo, como podemos ver na história do Reverendo Puritano Robert Kalley, aquelas poucas vitórias que não são transitórias colaboram para o progresso do Evangelho de tal maneira que obscurecem até as inúmeras derrotas que os Puritanos usualmente sofriam. Porque, no sacrifício amoroso que esses homens fizeram por Cristo, gerações e gerações foram beneficiadas: dos ensinos dos Puritanos ingleses do século XVI surgiu a bela obra do Rev. Jonathan Edwards no século XVIII, renomado como um dos três maiores teólogos da Igreja, ao lado de João Calvino e de John Owen. E nas obras de Jonathan Edwards e John Owen nos foi legado o precioso entendimento da soberana obra do Espírito de Deus, que em tempos de apostasia, opera três grandes obras da Graça - preserva um remanescente para Glória de Deus, reaviva o povo de Cristo e fomenta a Reforma da Igreja e do mundo. E todas estas operações do Senhor por meio desses servos encontra impulso na firme crença Puritana de que nem todos os sínodos do inferno em conjunto podem prevalescer contra a Igreja de Cristo [cf. Mateus 16:18]. Foi esta firme Fé que preparou o coração dos grandes missionários do século XVII em diante e que deu força às palavras de grandes pregadores do século XIX, como William Wilberforce, que comumente instruía aos Cristãos, pela Palavra, a não ver o mundo como um navio naufragando e do qual as almas dos homens têm de escapar, mas como propriedade adquirida de Cristo, a cujo reino a terra e sua plenitude pertencem [cf. Mateus 28:18, Atos 2:34-35].

Como examinamos mais detidamente em um texto passado do Jardim Clonal, aquilo que cremos molda nossa moral - nossa prática de vida é um reflexo de nossas doutrinas. Pois a Palavra de Deus e a alma humana formam um conjunto perfeito, uma vez que a alma foi criada para que a Palavra habitasse nela. Portanto, qualquer distorção na Palavra, qualquer falha na pregação do inteiro conselho de Deus, gerará uma falha na alma. Ora, as doutrinas Cristãs pregadas desde os tempos Apostólicos sofreram terríveis ataques no século XX, e, com isto, a esperança e a vida Cristãs foram terrivelmente afetadas – e, portanto, a alma Cristã foi terrivelmente afetada. O Dispensacionalismo, por exemplo, é uma doutrina que inexistia até o século XIX; é oriunda de pretensos arroubos proféticos e pesadelos - forjada aos pés do herético fundador de seitas chamado Edward Irving. Antes de prosseguir, lembremo-nos de que Satanás é astuto e muito ardiloso em suas armadilhas. Digo isto porque costumamos pensar que uma vez refutada a falta de bases bíblicas- que é a divisão arbitrária das dispensações deste falso ensinamento - e uma vez refutado o absurdo a respeito das múltiplas voltas de Cristo e ressurreições, esta heresia está eliminada. Pensemos no que, comumente, dizem as Escrituras, ao provarmos por elas que:

1) uma só promessa (ou seja, um só plano de redenção em Cristo) para a qual todas as Alianças (ou Testamentos) de Deus apontam [cf. Efésios 2:12] - em lugar da errônea visão Dispensacionalista que propõe vários pequenos sistemas com promessas próprias e dois grandes planos (um para Igreja e um para Israel) com promessas diferentes;

2) um só povo de Deus, pois a Igreja sempre subexistiu oculta em Israel e, uma vez tendo sido revelada, é anunciada como parte da mesma Oliveira à qual tantas profecias do Velho Testamento se referiam e que era tida como símbolo do verdadeiro Israel - porque nem todos de Israel eram verdadeiros Israelitas, e nem todos filhos de Abraão segundo a carne eram filhos de Abraão segundo a promessa [cf. Romanos 9:6-8; 11:17-24; Gálatas 6:16];

3) muita inconsistência nas afirmações dispensacionalistas. Por exemplo, na Primeira Epístola de Paulo aos Coríntios, Capítulo 15, versículos 51 a 53, o Apóstolo nos diz que todos seremos transformados ao ressoar da última trombeta. Os dispensacionalistas dizem que esta trombeta é a do “arrebatamento secreto”. Porém, o Evangelho de São Mateus no Capítluo 24, versículo 31, nos fala de outra trombeta que soará durante uma Grande Tribulação em Jerusalém. Para o dispensacionalista, a trombeta de Mateus soará sete anos depois da última trombeta, a qual Paulo se referiu. É obviamente um absurdo que haja uma outra trombeta depois da última.

4) somente uma segunda vinda de Cristo, segundo a Escritura. Este evento pode ser chamado de parousia, epifania ou revelação, o que é claramente compreendido pela comparação dos textos parelelos sobre este acontecimento, e onde podemos notar, pela ordem e descrição, que tratam de um único evento [ cf. Mateus 24:3; 1 Coríntios 15:23; 1 Tessalonicenses 3:13, 4:15,16 e 5:23; 2 Tessalonicenses 2:1,8; Tiago 5:7; 2 Pedro 3:4 e 1 João 2:28]. Há ainda, a afirmação clara do versículo 28 do Capítulo 9 da Epístola aos Hebreus, onde está escrito que Cristo aparecerá uma segunda vez. Não que nosso Senhor aparecerá uma segunda e uma terceira vezes, mas apenas uma segunda vez. Aparição esta que não é em nada secreta, mas com voz de arcanjo e com a trombeta do Senhor, todo olho o verá, sendo esta parousia também chamada de o dia do Senhor, dia tantas vezes citado na Escritura [cf. 2 Tessalonicenses 2:1,2; Apocalipse 1:7, Atos 1:11] o que contraria mais uma invenção dispensacionalista. Igualmente, a Escritura nos fala de só uma ressurreição,de ímpios e justos, exatamente no dia do Senhor [cf. João 6:39-40, 44, 54; 11:24; Mateus 13:30].

Então, todo o fermento dispensacionalista estaria eliminado. Porém, isto não é verdade. O maior estrago que o Dispensacionalismo fez foi também o mais sutil: contaminou a posição escatológica histórica da Igreja com um injustificável fatalismo. O Dispensacionalismo transformou o Reino de Cristo revelado na Nova Aliança que, segundo o profeta Daniel, é como uma rocha que despadaça os outros reinos e cresce, se tornando uma montanha até tomar todo o mundo [cf. Daniel 2:35], em um reles plano B de um deus frustrado em seus planos de transformar Israel em uma potência teocrática mundial. O Dispensacionalismo transformou a esperança Cristã de cumprir a Grande Comissão e de ver uma Igreja como a dos Puritanos – perseguida, porém capaz de transtornar o mundo pela Santidade, Poder e Palavra de Deus - em uma esperança de ser como que repentinamente resgatado de uma igreja derrotada pelo mal. A influência dispensacionalista habituou os homens à acomodação. Ao contrário do que este falso ensino diz, a Escritura nos mostra que o Senhor Jesus já é o Rei dos Reis cujo reino já chegou [cf. Marcos 1:15; Atos 17:7; Apocalipse 1:5], cujos inimigos estão sendo pouco a pouco derrotados e postos por Seu estrado [cf. Atos 2:33-36] e cuja parousia, para a qual devemos estar sempre preparados, não deve ser esperada para logo [cf. Mateus 25:1-9; Lucas 19:13; 2 Pedro 3:1-15] como se a batalha pela manifestação da Glória de Deus na terra não merecesse nossos esforços. Devemos expurgar de nossas mentes as influências do falso ensino e nos aprofundarmos nesta mesma Fé que os Puritanos e Reformadores receberam da Bíblia, pelo Espírito de Deus. Está escrito na Reflexão número 53, do Símbolo de Fé Kalleyano, que: “o Reino de Deus é o domínio da Sua Vontade em todos os setores desta vida, e é promovido pela expansão da Igreja em todo o mundo”; portanto, em humildade e contrição, com orações e súplicas, temos o dever de alargar os limites da nossa esperança no progresso da Igreja, ainda que cientes de que o joio crescerá no meio do trigo no campo do mundo até o fim dos tempos. O já citado grande Teólogo e Puritano congregacional John Owen, (cujas obras foram as primeiras a serem traduzidas pelo Rev. Kalley para o Português, enquanto ele ainda encontrava-se na Ilha da Madeira), disse a respeito da esperança da Igreja, em um de seus sermões: Ainda que a apostasia se mostre ao nosso redor, nossa causa permanecerá tão verdadeira, certa, e infalivelmente vitoriosa, quanto é verdadeiro o trono de Cristo à mão direita de Deus. O Evangelho sempre será vitorioso. Este grande conforto refrigera minha alma.” Este sentimento e certeza, que foram contaminados pelas heresias do último século, precisam retornar à Igreja, precisam retornar à cada um de nós. Porque, se tivéssemos ao menos um vislumbre da Glória futura da Igreja segundo as promessas da Escritura, então um grande conforto e um grande poder para ação habitariam nossas almas, tendo em vista que a certeza de fé inpira a operosidade. A Escritura promete que as fiéis testemunhas conservadas pelo Senhor em meio à apostasia e à perseguição, quando aparentemente derrotados, ressuscitarão dos mortos [cf. Apocalipse 11:3-13]. Necessitamos crer no chamado e eleição dos quais a Igreja é alvo, porque a face do Senhor resplandece sobre nós, e a habitação do Seu Espírito nos dá a certeza da eficácia de quem opera o nosso querer e efetuar. Então, as profecias da Escritura deixariam de ser um jeito de advinhar as notícias do jornal de amanhã e se tornariam uma rica fonte das promessas e conhecimento da Aliança de Deus conosco. Lamentemos, amados irmãos, lamentemos nossa ignorância quanto à Palavra do Senhor, pranteemos nossa falta de fé, nossa negligência e falta de dedicação, arrependamo-nos da mente carnal com que temos lidado com este assunto e do modo como temos nos deixado levar pelas sutilezas de Satanás. Quão pecaminoso é clamar Maranatha – vem, Senhor Jesus! sem, na verdade, dedicarmo-nos a submeter o mundo ao Evangelho, de modo que a Noiva esteja completa e preparada para receber seu Amado. Ah, se o Senhor nos levasse à contínua oração e obediência, e à clamar pelo mesmo conhecimento das promessas da Escritura, os quais aqueles Puritanos do passado tiveram! Ah, se o Espírito de Deus nos fizesse recuperar o senso da proeminência da Glória do Senhor e da preeminência de Cristo em todas as coisas! Então entenderíamos que o Senhor não se deixa escarnecer e que, portanto, nunca desamparará a Igreja - porque Ele ama ao próprio Nome! Quanto precisamos, arrependidos, nos humilharmos e prantearmos por tudo o que a Igreja perdeu! E nos purificarmos de todo erro e impiedade. Só assim veremos o Senhor operar novamente no nosso meio aquela firme Fé dos Puritanos e todo aquele ardor em lutar para encher toda a terra do conhecimento de Deus e na batalha pela Glória do Nome de Deus em todas as nações.

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